Udo Seckelmann
Pedro Heitor
No início de 2022, Gary Neville e Paul Scholes, ex-jogadores do Manchester United, anunciaram a criação do primeiro clube de futebol administrado por uma organização autônoma descentralizada (ou “DAO”), chamado de “CO92 DAO”. Em seguida, a empresa de criptoativos Kraken Holding Inc. demonstrou interesse em adquirir o Ipatinga Futebol Clube, campeão mineiro de 2005. Marcos Ferraz, CEO da Kraken, declarou que “a integração da empresa com o Ipatinga tem como proposta trazer a equipe para a nova fase do futebol global”. Recentemente, o Mercado Bitcoin anunciou seu interesse em criar um clube de futebol administrado via DAO. Estaríamos diante de uma nova revolução no mundo do futebol?
O conceito de “organização autônoma descentralizada” surgiu com o desenvolvimento e aperfeiçoamento de protocolos na Web 3.0, onde a gestão de organização e funcionamento é feita por um grupo de pessoas que se unem com um fim específico e constituem uma estrutura jurídica em forma de código, com regras específicas de governança inseridas em contratos inteligentes (“Smart Contracts”) na rede Blockchain.
Esse tipo de governança é descentralizada, ou seja, as tomadas de decisões pertencem aos token holders do protocolo, se diferenciando do modelo de gestão tradicional no qual um grupo seleto de participantes ditam o direcionamento do negócio. Diante desse cenário, esse modelo leva consigo o princípio de “Community-Ownership”, ou seja, a comunidade é a verdadeira proprietária do protocolo. Os tokens da DAO garantem aos adquirentes a capacidade de participar da comunidade de acordo com as regras do protocolo, como, por exemplo, o direito de votar sobre a operação, marketing, alocação de capital e outras atividades essenciais. O financiamento para que isso aconteça é proveniente justamente da comercialização de tokens que garante as usabilidades e experiências aos membros da organização.
Por outro lado, como essas organizações não são consideradas entidades jurídicas reconhecidas pela legislação de diversas jurisdições, uma série de dúvidas surgem, como em relação à estruturação societária, participação dos membros no contrato social, nível de descentralização, se as regras explícitas nos contratos inteligentes respeitam tal jurisdição, implicações regulatórias, direito de propriedade intelectual, requisitos de privacidade de dados e cibersegurança. Além disso, é necessário se adequar aos regulamentos da FIFA e da CBF (caso a DAO seja no Brasil).
Um dos problemas mais comuns em relação às DAO’s é a vulnerabilidade no código do contrato inteligente, onde hackers se aproveitam da situação e investidores sofrem perdas inimagináveis. Em 2021, a BZx DAO sofreu um ataque hacker em que os invasores conseguiram obter acesso às chaves privadas dos investidores, roubando cerca de 55 (cinquenta e cinco) milhões de dólares dos membros dessa organização.
É evidente, portanto, que temos um longo caminho a ser percorrido para compreendermos todas as possibilidades trazidas pelas organizações autônomas descentralizadas e suas implicações jurídicas tanto na indústria futebolística como nas jurisdições onde as DAO’s são constituídas.
A atuação do Bichara e Motta Advogados nas áreas que envolvem criptoativos, já é uma realidade.