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Congresso Nacional Aprecia Vetos à Lei Geral do Esporte

Em junho de 2023, a Lei Geral do Esporte (Lei nº 14.597/2023, ou “LGE”) foi sancionada pela Presidência da República com vetos a diversos de seus dispositivos. Em 9 de maio de 2024, o Congresso Nacional se reuniu para apreciar parte destes vetos, gerando implicações importantes para o esporte brasileiro.

No total, vetos referentes a 19 artigos da lei foram rejeitados, enquanto 3 foram mantidos. Contudo, cerca de 70 dispositivos vetados ainda estão pendentes de análise em uma próxima sessão.

Destacamos abaixo os seguintes vetos à LGE rejeitados ou mantidos pelo Congresso nessa primeira avaliação.

Vetos rejeitados

– Arbitragem para questões disciplinares, patrimoniais e de emprego (art. 27, parágrafo único)

O dispositivo admite o uso da arbitragem como meio para resolução de conflitos de natureza esportiva, no que se refere à disciplina e à prática esportiva, bem como para questões patrimoniais, inclusive de trabalho e emprego.

O veto tinha como justificativa uma potencial ofensa ao princípio do acesso à justiça (CRFB, art. 5º, XXXV), bem como um alegado risco à uniformidade das decisões sobre disciplina esportiva. Quanto aos litígios sobre questões patrimoniais e trabalhistas, o veto apoiava-se em um possível comprometimento da integral aplicação do Direito do Trabalho, ao permitir a arbitragem para qualquer empregado, independente da faixa de remuneração, e talvez até mesmo ausente a sua manifestação de vontade.

No entanto, a regra do parágrafo único do art. 27 deixa claro que, se adotada, a arbitragem deve observar os critérios da legislação própria sobre o tema (Lei nº 9.307/96). Além disso, o dispositivo segue o caminho anteriormente aberto pela introdução do art. 507-A à CLT por meio da reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017).

– Dispensa do diploma em nível superior para aplicação do parágrafo único do art. 444 da CLT (art. 86, §12)

Ainda na esfera da reforma trabalhista, a Lei nº 13.467/2017 adicionou o parágrafo único ao art. 444 da CLT, permitindo ao empregado, portador de diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, a livre estipulação das relações contratuais de trabalho, prevalecendo sobre a convenção ou acordo coletivo.

O art. 86, §12 da LGE, agora não mais vetado, reforça a aplicabilidade da supramencionada regra aos contratos especiais de trabalho esportivo, porém dispensa a exigência do diploma de nível superior quando o atleta profissional for assistido na celebração do contrato por advogado de sua escolha.

– Inaplicabilidade à SAF das contrapartidas para recebimento de recursos públicos (art. 37)

Conforme o art. 37 da LGE, não são exigidas às Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs) as contrapartidas de gestão esportiva dispostas no art. 36, a fim de que sejam beneficiadas com repasses de recursos públicos federais da administração direta e indireta e de valores provenientes de concursos de prognósticos e de loterias.

Entretanto, ainda que não submetidas às condições do art. 36, as SAFs já devem seguir critérios próprios de gestão e governança, conforme definidos na legislação específica (Lei nº 14.193/2021).

– Direito de Arena (art. 160, §1º)

O art. 160, §1º da LGE determina que 5% da receita proveniente da exploração de direitos de difusão de imagens de eventos esportivos serão repassados pelas organizações esportivas mandantes aos atletas profissionais participantes, proporcionalmente à quantidade de partidas ou provas por estes disputadas, como parcela indenizatória de natureza civil.

Apesar de em linha com o que já era estabelecido pela Lei Pelé (Lei nº 9.615/98), o dispositivo havia sido vetado por ausência de estimativa do impacto orçamentário e financeiro sobre receitas da União, em razão das repercussões tributárias deste repasse.

– Fundos de Esporte e Fundesporte (art. 40 a 49)

Foram retirados os vetos sobre a criação de fundos de esporte vinculados ao Sistema Nacional do Esporte (Sinesp), com o objetivo de centralizar recursos e de fomentar atividades esportivas. Os dispositivos tratam ainda sobre as condições para repasses de recursos aos estados, Distrito Federal e municípios, além da introdução do Fundo Nacional do Esporte (Fundesporte) em favor de organizações esportivas, a fim de viabilizar a construção de instalações, a realização de competições, a capacitação de profissionais, entre outros objetivos descritos na lei.

– Demais vetos rejeitados

– Art. 15, que prevê a cooperação dos clubes e associações na coordenação e execução de normas e políticas públicas na área esportiva.

– Art. 34, parágrafo único e 36, §1º, sobre critérios para recebimento de recursos públicos provenientes de concursos de prognósticos, sorteios e loterias, inclusive por SAFs.

– Art. 153, acerca da autorização e supervisão de eventos esportivos em via pública pelas organizações que regulam a respectiva modalidade.

– Art. 212, que disciplina o credenciamento e acesso de jornalistas a praças esportivas.

Vetos mantidos

– Mitigação da cláusula compensatória esportiva (art. 86, §5º)

O texto da LGE enviado à sanção presidencial previa a mitigação do valor correspondente à cláusula compensatória esportiva, com base no eventual novo contrato de trabalho assinado pelo atleta com um próximo clube. Assim, estaria o clube anterior remido do pagamento das parcelas finais da referida cláusula quando o salário do atleta com o novo clube fosse igual ou superior àquele que recebia anteriormente. Caso inferior, seria devida somente a diferença.

Apesar de similar ao fixado em nível internacional pela FIFA (conforme o art. 17 do Regulamento da FIFA sobre o Status e a Transferência de Jogadores – RSTP), o dispositivo foi vetado por potencial ofensa ao art. 5º, caput da Constituição e à autonomia do credor quanto à decisão de remir dívidas, prevista, como regra geral, pelo art. 385 do Código Civil, especialmente em se tratando de parcela de natureza trabalhista.

– Acidente de trabalho (art. 86, §11)

O art. 86, §11 previa a possibilidade de o clube optar por não comunicar o acidente de trabalho sofrido por atleta, assumindo a integralidade dos salários até a plena recuperação, afastando-se então qualquer estabilidade ou indenização substitutiva prevista em lei.

O dispositivo foi vetado por colocar o atleta como a única categoria laboral que não gozaria da estabilidade decorrente de acidente de trabalho. Além disso, ao admitir a possibilidade de o empregador optar por não comunicar o acidente, a regra vulneraria a rede de proteção ao trabalhador assegurada pela Constituição e prevista na legislação nacional.

– Fundesporte e recursos do SUS (art. 48, V)

Permanece vetado o dispositivo que destinava 5% dos recursos do Sistema Único de Saúde (SUS) ao Fundesporte, por descumprimento da Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2023 (Lei nº 14.436/2022).

– Próximos passos

Seguindo o que determina a Constituição, os dispositivos cujos vetos foram rejeitados são encaminhados à Presidência da República para promulgação.

Contudo, há diversos outros artigos vetados que estão pendentes de apreciação pelo Congresso Nacional. Entre estes, ressalta-se a possibilidade de as organizações de administração do esporte editarem seus próprios códigos de Justiça Desportiva (art. 27, II), as regras especiais sobre a tributação das atividades esportivas (art. 103 a 127 e 139) e a revogação expressa da Lei Pelé (art. 217, II). Para tanto, a respectiva próxima sessão do Congresso Nacional está convocada para 28/05/2024.

O time de Direito Desportivo de Bichara e Motta Advogados está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos adicionais sobre o tema.

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